Publicidade
Carreira Centauro: A Evolução Profissional na Era da Inteligência Artificial
04 de Abril de 2024

Carreira Centauro: A Evolução Profissional na Era da Inteligência Artificial

Centauros são um novo tipo de trabalhador que incorpora uma relação simbiótica entre ferramentas de IA como ChatGPT

Publicidade
Por Prof Jonny 04 de Abril de 2024 | Atualizado 04 de Maio de 2024

 

Contexto

Publicidade

Vivemos numa época muito especial com grande produção de informação, sobretudo com o crescimento da aplicação da Inteligência Artificial nos vários campos da sociedade, influenciando educação, indústria, comunicação, entre outros. Particularmente, por trabalhar com IA à Engenharia há mais de 25 anos, e pela atuação neste portal como colunista de carreira, tenho sido questionado sobre como o mundo do trabalho está sendo e será impactado pelo crescimento da IA.

Como alguém que pratica o aprendizado contínuo, no ano passado, me interessei por ampliar a visão sobre este assunto, buscando entender as implicações da IA no universo do trabalho e perspectivas futuras. Neste sentido, fiz o curso AI, Business & the Future of Work, ministrado pela renomada instituição sueca Lund University (1). O curso foi realmente muito bom para ampliar minha perspectiva sobre o tema para além da engenharia. Entre as principais referências a que tive acesso, uma das que considero mais relevantes foi o artigo New Centaurs and Leadership (2). Basicamente, este artigo aborda como os líderes do futuro nas diversas áreas devem adotar uma abordagem híbrida em suas atuações, mesclando criatividade, capacidade de decisão e outras características humanas, com a enorme performance computacional, cada vez mais disponível. Desde então, tenho buscado difundir este conceito nas minhas interações através das palestras e podcasts (3).

Este artigo tem também este objetivo, buscando compartilhar com você, leitor, algumas reflexões que podem ser úteis para criar esta “postura centauro” em sua carreira. Para ilustrar isto, apresento um breve contexto histórico, seguido de algumas referências no mundo do trabalho e concluo com um exemplo prático sobre esta abordagem, inclusive detalhando alguns desafios de comunicação entre as duas partes do centauro.

Um pouco de história…
Considero que seja bem difundido na mente coletiva a visão do que é um centauro, uma figura presente na mitologia grega. Por exemplo, com um humor ímpar e uma descrição quase jornalística, como se tivesse presenciado os “fatos”, nos conta o ilustre professor Clóvis de Barros Filho em seu livro “Os doze trabalhos de Hércules” (4), que após a exaustiva batalha encerrada com a morte de Hidra, a servente de múltiplas cabeças, Hércules foi recebido por Pholus e Quiron, dois centauros amigos. Mas o leitor pode se perguntar: E como este mito veio parar no mundo do trabalho?

Daí surge outra “lenda”, esta que transita no nosso mundo real, trata-se do campeão de xadrez Garry Kasparov que ganhou fama internacional aos 22 anos, quando se tornou o mais jovem campeão mundial de xadrez. A façanha aconteceu em novembro de 1985, ao derrotar Anatoly Karpov (5). Kasparov tornou-se uma referência neste campo, tanto que foi convidado pela gigante IBM para um torneio que marcou a história da IA. Em 1996, Kasparov derrotou o supercomputador “Deep Blue”, da IBM, em um torneio de seis partidas. Entretanto, uma versão melhorada da máquina venceu o campeão em 1997. Esta parte é relativamente conhecida. Na época, estava na Inglaterra fazendo parte do meu doutorado, e lembro de acompanhar os grupos de discussão em IA, e os dois torneios estavam entre os tópicos mais quentes. O que ocorreu depois pouca gente sabe, eu pelo menos não sabia até descobrir o tal artigo citado acima. Garry Kasparov resolveu criar torneios de xadrez em que humanos poderiam jogar contra computadores e humanos, cunhando daí o termo “Xadrez Centauro”.

Desses experimentos, um, em particular, trouxe descobertas interessantes. Em 2005, houve um torneio de xadrez no qual todos os tipos de entidades podiam competir: computadores, campeões de xadrez e equipes mistas compostas por humanos e computadores. Já se esperava que os computadores vencessem os campeões de xadrez, mas o que não se esperava era que equipes mistas vencessem os computadores. Em outras palavras, a combinação humano e IA parecia ser mais eficaz do que a IA sozinha. A ideia do Centauro como modelo para trabalhos futuros começava a tomar forma (6).

A visão centauro no mundo do trabalho.
O artigo “How to become a centaur” traz interessantes cenários de tarefas do campo de moda e design em que humanos e máquinas atuaram juntos na execução dos objetivos (7). Uma das reflexões mais interessantes do estudo é que nos exemplos de centauros, o humano escolhe as perguntas, na forma de estabelecer metas e restrições, enquanto a IA gera respostas, geralmente mostrando múltiplas possibilidades ao mesmo tempo e em tempo real para perguntas dos humanos. Mas não é apenas uma conversa unilateral: o humano pode em seguida, questionar as respostas da IA, fazendo perguntas mais profundas, escolhendo e combinando respostas e guiando a IA usando a intuição humana. De forma bem intuitiva, isto foi aplicado no exemplo ilustrativo que apresento mais adiante.

Ainda sobre a avaliação das tarefas que combinam humano e IA, o artigo “Centaurs: The future of work” cita que o professor de economia da Universidade George Mason, Tyler Cowen, estudou xadrez centauro e dedicou um capítulo sobre isso em seu livro Average is Over. Sua pesquisa concluiu que os jogadores centauros têm vantagem sobre os melhores programas em 100-150 pontos de classificação, o que sugere que se espera que ganhem cerca de 67% das vezes (8). Este texto apresenta ainda exemplos bem interessantes, sobretudo, na área médica. Além desta conclusão, o artigo destaca dois insights: 1. As equipes humano-computador são as melhores. 2. A pessoa que trabalha com uma máquina inteligente não precisa ser um especialista na tarefa à mão.

Este segundo ponto é bastante surpreendente. Você não precisa ser um especialista em seu domínio para alcançar um desempenho de nível especializado, se você complementar suas habilidades com os de uma máquina. De certa forma, isto confirma algo que pesquiso há algum tempo, pois todo objetivo do desenvolvimento de Sistemas Especialistas, sub-área da IA em que me especializei, está alicerçado nesta premissa.

Em se tratando da educação, especificamente na formação de programadores de software, a referência (6) traz um ponto bem interessante. O texto propõe que na indústria de software, essa transformação deve iniciar nas universidades. As universidades devem começar a explorar e integrar esses novos modelos de colaboração em seus currículos de desenvolvimento de software preparando para o futuro a força de trabalho para um ambiente de programação mais eficiente e produtivo. Não basta preparar os futuros programadores, eles devem preparar futuros programadores centauros.

Mas, afinal de contas, o que caracteriza um centauro no trabalho?
Analisando o contexto muito recente do mercado europeu, a referência (9) responde, de forma muito elegante, esta pergunta:
Centauros são um novo tipo de trabalhador que incorpora uma relação simbiótica entre ferramentas de IA como ChatGPT e capacidades humanas, aumentando a produtividade e a eficiência. Esses trabalhadores combinam a criatividade e a intuição humanas com a eficiência da IA, otimizando tarefas como pesquisa, criação de conteúdo e resolução de problemas.

Um exemplo ilustrativo
Neste ponto, espero ter deixado você, leitor/leitora, suficientemente convencido do que é este novo cenário no universo do trabalho. Talvez, dependendo do tipo de sua atividade atual, você já incorpore algumas das características de um centauro em suas tarefas. Como complemento, gostaria de finalizar este artigo com um exemplo ilustrativo.

Como exposto acima, estou com esta “visão centauro” há algum tempo. No podcast que participei, em 22 de abril, notei como esta visão despertou interesse do apresentador, por ele perguntar mais de uma vez sobre o assunto. Então, no primeiro fim de semana após o podcast, tive a ideia de escrever este artigo. Imediatamente, conversei com meu “copiloto de bolso”, aliás, frequentemente tenho “papos bem interessantes” com ele, Copilot da Microsoft (10), o chatbot que venho usando. Apresentei para ele a ideia de escrever um artigo sobre o cenário centauro no mundo do trabalho, enviei o primeiro link que mencionei aqui, aquele artigo que obtive no curso da Lund University, e pedi outras referências tanto históricas (sobre a ideia inicial de Kasparov) como mais específicas sobre centauro no mundo do trabalho. Confesso que neste segundo pedido, o copilot foi mais limitado, inclusive repetindo uma referência, daí obtive outras referências no “bom e velho Google mesmo”. Em todo caso, em apenas alguns instantes recebi uma quantidade significativa de referências a pesquisar para fundamentar este texto que você está lendo.

Também usei o sistema Designer, acessível através do Copilot, para criar a figura ilustrativa deste artigo. Neste ponto, foi até bem divertido e um pouco exaustivo, pois a máquina gerou as primeiras figuras mostrando unicórnio (em vez de centauro) embaixo de árvores ou noutras paisagens. Finalmente, após algumas interações, a máquina gerou a figura que escolhi aqui, que depois de um tempo observei que sofreu outra “mutação genética”, por ter vindo com cinco pernas. Confesso que até tentei repetir o processo para gerar um quadrupede “mais normal”, mas não tive êxito, e deixei assim mesmo. Espero ter um “desconto” de sua parte, leitor/leitora, pense que este ser tenha sido submetido a uma contaminação nuclear que gerou esta anomalia.

Ainda sobre a criatividade computacional, depois de concluir o artigo, decidi por um título provisório (Seja um centauro em sua carreira!), voltei ao Copilot, enviei o parágrafo inicial e este título, pedindo três opções impactantes, dando a instrução que tivessem as palavras centauro e carreira, e escolhi a que considerei a melhor das três. Resumindo os passos desta interação:

1 – Criatividade e tomada de ação: insight de escrever sobre um tema que havia despertado interesse do público, e sobre o qual já tinha ideia fundamentada, mas me faltavam mais referências.

2 – Comunicação para geração de informação: neste caso, você, leitor/leitora, muito provavelmente tem acesso a todas estas ferramentas, mas pode ser necessário desenvolver a habilidade de tratar com isto de forma mais natural. Aqui, me vem outra figura grega, o Oráculo de Delfos, que na antiguidade era consultado por diversas pessoas sobre praticamente todo tipo de assunto. Então, pense nestas máquinas como “oráculos atuais”, com o qual você pode interagir de forma muito natural.

3 – Exploração das fontes e decisão: o fato de uma máquina gerar, em alguns minutos, acesso a uma multiplicidade de referências que “antigamente” poderia levar alguns meses, transfere mais responsabilidade ao humano para ter discernimento na utilização destas referências e gerar algo de valor à sociedade.

Na minha limitada visão, os passos 1 e 3 continuarão sendo por um bom tempo responsabilidades do humano, sobretudo nas tarefas mais complexas.

Finalizando, em vez do cenário do “exterminador do futuro”, em que máquinas buscam “dominar o mundo”, tenho o panorama em que de forma muito natural humanos irão colaborar cada vez mais com humanos e máquinas para o bem comum. Lendo isto, você pode até achar um sonho, mas lembrando John Lennon, em sua célebre música Imagine:

Você pode dizer que eu sou um sonhador, mas eu não sou o único
Eu espero que um dia você se junte a nós, e o mundo será como um só!

Se você preferir uma visão menos poética, encerro com a eloquente fala de Garry Kasparov:
“A Inteligência Artificial nos ajudará a liberar a criatividade humana. Os humanos não serão redundantes ou substituídos, eles serão promovidos”.(11)

Em síntese, espero que estas reflexões façam sentido a você, e que comece a encarar esta realidade do mundo do trabalho, que ao meu ver chegou para ficar de forma mais natural possível e lhe inspire para buscar conhecimento a serviço da sociedade.
Grato pela leitura. Nos encontramos no próximo artigo!

 

Abraço, Jonny

 

Fontes:
1- AI, Business & the Future of Work, Lund University, acesso abril 2024 (link)
2- New Centaurs and Leadership, IE Insights, 2017 (link)
3- Entrevista ao podcast Gigantes da Educação, Episódio 45, 22 abril, 2024 (link)
4-Os doze trabalhos de Hércules, Clóvis de Barros Filho & Joel Jota, Editora Citadel, 2023.
5- Conheça a história de Kasparov. Portal G1, 2007 (link)
6-The centaur programmer – How Kasparov’s Advanced Chess spans over to the software development of the future, 2023. (link)
7- How To Become A Centaur · Journal of Design and Science, 2018. (link)
8- Centaurs: The future of work?, 2020. (link)
9- AI & work in Europe in 2024: are Centaur Workers the future of the workforce?, 2024. (link)
10- COPILOT- A IA da Microsoft, acesso abril 2024. (link)
11- Don’t try and beat AI, merge with it says chess champ Garry Kasparov, 2018. (link)

 

Publicidade
Publicidade