A arte é um chamado que, às vezes, só pode ser escutado mais tarde. Foi assim na vida destas duas mulheres, que tiveram passagem pela Arquitetura, mas só na melhor idade puderam viver da sua arte.
Natural de Volta Redonda, interior do Rio de Janeiro, a arquiteta e urbanista Leticia Barroso, 69 anos, descobriu a literatura após a COVID-19. “A escrita foi uma forma de extravasar a dor que estava sentindo”, conta a autora que percorreu algumas cidades até aportar em outro destino, bem mais precioso. Passagem de Ida, seu livro de estreia, acabou a conduzindo para uma viagem rumo a seu interior. “Sem dúvida, a maior descoberta. Foi um processo de cura”, define.
Leticia Barroso
A escrita, fruto das experiências de vida e das reflexões da viagem, fizeram nascer Passagem de Ida. A obra de estreia da escritora Leticia Barroso é um livro de memórias, com linguagem poética e sensível, que reúne narrativas sobre as vivências da viagem e descobertas durante o período crítico enfrentado pela humanidade. Além do vírus letal, a escritora reflete sobre outras ameaças, outros momentos que se entrecruzam e trazem à tona reflexões sobre o modelo de sociedade de consumo em que vivemos e que também colocam a vida em risco, a exemplo de questões enfrentadas pelas mulheres, como a invisibilidade do trabalho doméstico, entre outras. “É uma obra literária que nos leva a uma jornada de autoconhecimento e descoberta pessoal”, define o filho da escritora, Bruno Barroso, no prefácio da obra.
A trajetória de Leticia, divorciada e mãe solo de dois filhos, hoje já adultos, gera identificação com muitas leitoras. Depois da separação, ela enfrentou desafios bem conhecidos por mulheres que se equilibram entre as demandas da maternidade e a carreira. Um novo livro, que já está sendo gestado, tratará de questões de gênero, família e moral imposta. Letícia confidencia que suas vivências seguirão embalando diálogos e silenciamentos de toda uma vida.
Ana Laura Lacerda
Nascida em Salvador, Ana Laura Lacerda tem 62 anos. Chegou a estudar Arquitetura, mas preferiu trilhar o caminho das artes. Sua paixão por conchas começou na juventude e lhe rendeu o título de “a artista da Amazônia Azul”, já que 99% da sua matéria-prima vem da Baía de Todos os Santos. Tinha pouco mais de 20 anos quando, no ano de 1982, teve sua primeira exposição solo no Foyer do Teatro Castro Alves (TCA), o mais importante da capital baiana. Três anos depois, ganhou reconhecimento no Salão Paulista de Belas Artes. “Cada concha tem uma beleza única, a variedade de cores, formas e texturas impressiona… Meu trabalho é fruto da infinita arte do Criador!”.
Por conta da maternidade, Ana Laura Lacerda acabou dando uma pausa na carreira. A retomada da artista que é descendente do engenheiro que construiu o Elevador Lacerda, cartão postal da capital baiana, foi em 2020, pouco antes da pandemia. Uma de suas obras, com quase três metros, decora um grande hotel da cidade. No seu ateliê, no charmoso bairro do Santo Antônio Além do Carmo, a artista produz com a intenção de realizar uma mostra comemorativa e itinerante, que acontecerá em Salvador e outras capitais. “Arte para mim é refúgio. Cada quadro que inicio renova minha esperança de vida”, define a artista.