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Governança e Estratégia | Uma conversa com Henri Vahdat sobre Liderança Inspiradora
30 de Setembro de 2023

Governança e Estratégia | Uma conversa com Henri Vahdat sobre Liderança Inspiradora

Uma proporção significativa de estratégias, meticulosamente elaboradas por empresas profissionais, é mal executada pelo baixo envolvimento da alta liderança

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Por Prof Jonny 30 de Setembro de 2023 | Atualizado 01 de Outubro de 2023

 

Henri Vahdat é nascido em Porto Alegre, filho de iranianos, formado em Engenharia Elétrica, Tecnologia e Sistemas de Informação pela PUC/RS, com MBA Executivo Internacional pela USP e Mestrado em Administração de Empresas pela PUC/SP. Sua carreira é marcada por atuações nas maiores empresas de consultoria do país como Ernst & Young, Andersen Consulting, Accenture e Deloitte, participando nesta última como sócio-líder. Há mais de 10 anos, Henri é membro do IBGC- Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, tendo atuado como seu diretor executivo por alguns anos. Sua jornada é uma inspiração para todos que buscam equilibrar as complexidades da liderança corporativa, com um compromisso apaixonado com o desenvolvimento pessoal e profissional. Nesta entrevista, ele compartilha lições aprendidas ao longo dos anos, fornecendo orientações práticas para aqueles que buscam trilhar um caminho semelhante.

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Agradeço muito por sua disposição em contribuir com nossa coluna sobre carreira. Sabemos que, em muito, nossas trajetórias são influenciadas diretamente pelas decisões. Como ocorre com vários engenheiros, a sua carreira teve início em área mais técnica e, gradativamente, migrou para a gerencial. A que você acha que se deve esta mudança? E até que ponto, esta alteração de rumo influenciou o restante de sua trajetória?

A bem da verdade, ao longo de toda a minha carreira, sempre fui um profissional com um perfil mais técnico. Com o passar dos anos, contudo, migrei de uma carreira 100% focada em tecnologias da informação para uma carreira, progressivamente, mais consultiva e focada em tecnologias voltadas à melhoria das operações e negócios das empresas. Com meu ingresso na EDS, a partir de 1994, comecei a participar da criação de Planos Diretores de TI (PDTI) e da implementação de sistemas integrados de gestão empresarial (ERPs) nos clientes. Essa mudança, de natureza estrutural, mudou definitivamente o rumo da minha carreira profissional nos anos seguintes.

 

Outro ponto interessante de sua trajetória foi a migração de empresas desenvolvedoras de produtos, quer sejam hardware ou software como TDA, Sisgraph e Rhodia, para o setor de consultoria, atuando inicialmente na EDS (uma divisão da General Motors). Visando fornecer orientações para quem enfrenta decisões deste tipo, quais diferenças você diria que são marcantes quando se atua nestes dois tipos de empresa, desenvolvedora de produtos ou consultoria?

A decisão de partir para a EDS foi, talvez, a mais importante da minha carreira profissional. Ao longo dos 10 anos anteriores, eu havia acumulado um grande repertório de conhecimentos e habilidades relacionados a hardware, software, desenvolvimento de sistemas e gestão de redes de processamento distribuído. Agora, porém, atuando em uma empresa francesa de produtos químicos, farmacêuticos e têxteis (Rhodia), eu me sentia exercendo uma função ligada a uma atividade-meio e não à atividade-fim da organização. Assim, decidi pivotar a minha carreira para uma empresa onde a minha função pudesse estar mais ligada ao “core business” da companhia. Essa mudança da Rhodia para a EDS – um verdadeiro ponto de inflexão na minha carreira – me fez transicionar de um papel eminentemente focado na identificação de problemas e busca de soluções para uma única empresa para uma função mais ampla, consultiva, e de assessoria profissional à tomada de decisão gerencial de um grupo incomparavelmente maior de empresas. As mudanças subsequentes para Ernst & Young, Andersen Consulting, Accenture e Deloitte só ajudariam a ampliar, ainda mais, o portfolio de competências – como gerenciamento de projetos, gestão de riscos, gestão de equipes e gestão do relacionamento com clientes, dentre outras – necessárias a uma carreira bem-sucedida em consultoria empresarial.


Em março de 2013, você se torna diretor executivo do IBGC-Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, função na qual permaneceu por cinco anos, continuando depois como instrutor da organização. Diante do recente interesse pelo tema ESG (ou ASG em português), você poderia descrever, em breve palavras, as principais atividades do IBGC? E como ocorreu sua inserção neste mundo específico da Governança?

O IBGC é o principal instituto de governança corporativa do Brasil e uma das maiores referências do mundo nessa área. Fundado em 1995, o IBGC tem por objetivos produzir e disseminar conhecimentos em governança corporativa e influenciar os mais diversos agentes na adoção de melhores práticas, contribuindo para o desempenho sustentável das organizações e, consequentemente, para uma sociedade melhor. O IBGC desempenha o seu papel de think tank da governança através de uma comunidade com mais de 1.500 associados, capítulos distribuídos nas principais metrópoles do país, comissões temáticas e setoriais, pesquisas, publicações, congressos e cursos abertos e in-company.

A minha aproximação ao IBGC se deu por conta das minhas responsabilidades à época na Deloitte. A minha linha de serviços na empresa era a responsável pela oferta de soluções em governança. Nessa perspectiva, entendemos que a nossa presença no IBGC poderia reforçar o nosso relacionamento com o Instituto, bem como o nosso posicionamento nesse mercado. Assim, me associei ao IBGC e comecei a frequentar a Comissão de Pessoas – uma das várias comissões temáticas da casa da governança. Pouco tempo depois, fui o coautor do primeiro caderno de Melhores Práticas de Gestão de Pessoas para Conselhos de Administração e CEOs. Esse lançamento, que ocorreu em 2011, teve uma grande repercussão nos meios empresariais, pois o consagrado professor e autor Ram Charan prefaciou a obra e foi o âncora do evento. Tive o privilégio de ser seu cicerone durante aquele dia em que esteve conosco em São Paulo.


Em recente contato que tivemos, por ocasião de sua consultoria para a Escola das Nações, de cujo Conselho sou membro, você fez referência ao relatório de 2013 da The Economist, “Why good strategies fail Lessons for the C-suite”. Você poderia resumir as principais conclusões daquele relatório? E, considerando que já se passou uma década, na sua opinião, até que ponto aquela realidade se manteve ou como foi alterada nas organizações?

Fundamentalmente, o que a prestigiosa revista The Economist indica nesse importante relatório produzido pela sua área de pesquisas (Economist Intelligence Unit) é que, enquanto um amplo número de empresas se destaca no processo de formulação de suas estratégias de negócios, elas, com muita frequência, posteriormente fracassam durante o processo de sua implementação. Em resumo, o que se descobriu é que uma proporção significativa de estratégias, meticulosamente elaboradas por empresas profissionais, é mal executada e que uma das principais causas é o baixo envolvimento da alta liderança dessas organizações com o processo de implementação. Outras causas também apontadas pelo documento envolvem a falta de buy-in por parte da organização; a falta de atenção e suporte por parte do corpo gerencial; a necessidade de maior investimento de tempo e recursos, tendo em vista maior complexidade, riscos e restrições envolvidos no processo de execução; a dificuldade em se traduzir decisões estratégicas em ação pela falta dos conhecimentos e habilidades necessários; e a incapacidade de se conduzir processos de mudança, de forma efetiva, ao longo do ciclo de vida dos projetos. O relatório, então, sugere, ao analisar casos de sucesso, uma comunicação clara da estratégia para todos os níveis de uma organização – desde os executivos de topo até os funcionários da linha de frente –, o monitoramento constante do processo e ciclos de feedback para rastrear o progresso da implementação da estratégia e fazer os ajustes necessários. Em suma, a estratégia deve se tornar uma tarefa de todos e a alta administração deve desempenhar um papel ativo na supervisão desse processo, garantindo que haja o necessário alinhamento entre a visão estratégica e sua execução.

Com base em minha experiência, as falhas apontadas no relatório da revista The Economist são aspectos observáveis até os dias de hoje. Por essa razão, uma escola de pensamento em estratégia denominada Open Strategy propõe, hoje, uma nova abordagem para que as realidades descritas anteriormente não se repitam.


Ainda nesta recente interação que tivemos, você apresentou que aplica a Open Strategy como modelo para criação de planejamento estratégico nas organizações. Quais são os principais conceitos desta abordagem? E como uma organização deve ser preparar caso queira adotar este modelo em seu cenário?

Basicamente, o que essa nova escola de pensamento em estratégia recomenda é que o ciclo da estratégia abranja um arco mais amplo, contemplando três fases principais – (1) diagnóstico e ideação, (2) formulação da estratégia e decisão e (3) execução e monitoramento. Além disso, orienta que o processo da estratégia não seja monopolizado por um pequeno círculo de pessoas da alta administração. Ao contrário, destaca a importância de o processo da estratégia – a exemplo dos modelos de inovação aberta – ser aberto e inclusivo, de modo a poder incorporar a contribuição de todas as partes interessadas mais relevantes da organização. Essa parece ser a nova receita para se minimizar riscos e se maximizar as chances de sucesso das estratégias de negócios para organizações de todos os tamanhos e setores de atividade.

Naturalmente, para que o processo do Open Strategy possa gerar o maior benefício possível, será preciso que a cultura da empresa esteja genuinamente aberta e receptiva às contribuições de um grupo maior de pessoas. Não se trata de uma “democratização” das decisões estratégicas, mas em abrir o processo de geração de ideias e de exploração de caminhos estratégicos de uma organização à contribuição de seus key stakeholders internos e externos. Organizações que já estão utilizando a nova metodologia reportam uma maior riqueza de conteúdo e insights durante o desenvolvimento de suas estratégias, níveis mais elevados de engajamento dos seus quadros profissionais e menores barreiras durante o processo de implementação.


Na sua trajetória profissional, existe também um marco de empreendedorismo, quando em 2016, você conclui um ciclo em grandes empresas de consultoria, e cria a Lighthouse Consultoria e Assessoria Empresarial. Considerando os riscos da atividade empreendedora no país, como você descreve esta transição? E quais foram os maiores desafios e aprendizados enfrentados?

Acredito que entre os ativos mais valiosos que podemos colecionar, ao longo das nossas carreiras, estão os relacionamentos que firmamos com pares, colegas, clientes e parceiros de negócio. Em 2016, já com cerca de 5 anos de experiência na condição de sócio da empresa Deloitte, senti que a minha carreira já estava suficientemente madura para eu associá-la, agora, a uma marca própria e não mais a uma das BIG FOUR – as maiores casas de consultoria e auditoria do mundo. Assim, com essa confiança presente na mente e no coração e, confirmando essa percepção com a minha esposa e alguns clientes mais próximos, tomei a decisão de me desvinculei da Deloitte e partir para uma etapa de empresariamento na minha carreira – experiência essa que não havia vivenciado até então. O risco de fazer esse movimento, avaliei na época, seria equivalente àquele de permanecer na empresa, pois à época eu já tinha responsabilidade total por uma das linhas de negócio da companhia. Julguei, portanto, que se tinha conseguido alcançar sucesso em um ambiente de negócios de maior complexidade, servindo grandes empresas, provavelmente conseguiria fazer o mesmo, e eventualmente até melhor, em uma escala menor. Assim, fundei com minha esposa – engenheira química – a Lighthouse Consultoria e Assessoria Empresarial.

Um dos desafios que tivemos, logo no processo de abertura da empresa, foi buscar uma marca que comunicasse de forma muito clara o tipo de parceria que gostaríamos de oferecer com a nova empresa aos nossos clientes. Depois de várias consultas, chegamos ao nome LIGHTHOUSE (Farol), por entender que o papel de uma assessoria empresarial, longe de ser o de tomar decisões pelos clientes, deve, isto sim, ser o de iluminar o caminho à frente, apontando riscos e oportunidades, e possibilitando uma navegação segura em direção a objetivos empresariais. Um outro desafio que enfrentamos foi a obrigatoriedade de respeitar uma cláusula de “não competição” com a minha empresa anterior – cláusula essa comum nos grandes escritórios de consultoria e auditoria para sócios que deixam a organização. Durante os primeiros 12 meses de operação da Lighthouse não poderíamos acessar nenhum dos clientes que costumeiramente eu atendia como sócio da Deloitte.

Em termos de aprendizados, creio que vale destacar que descobrimos – para nosso alívio e maior serenidade – que nova economia do conhecimento, “tamanho, não é documento”. O que importa, no final do dia, é a sua capacidade de agregar real valor aos clientes. Em várias oportunidades, ganhamos projetos concorrendo com consultorias incomparavelmente maiores e mais conhecidas.

 

Sabemos que muitas vezes o trabalho voluntário pode servir de fonte de conhecimento e até para despertar no indivíduo habilidades que estavam latentes. No seu caso, você teve experiência com algum serviço voluntário ou humanitário que considera ter contribuído para sua carreira? Se sim, pode compartilhar com nosso público algo sobre isto?

Tive o privilégio, em 2019, de ser convidado pela Universidade Nur – uma instituição educacional de inspiração bahá’í, localizada em Santa Cruz de La Sierra, Bolívia – para estruturar um programa de mestrado na área de desenvolvimento social. Fiz este trabalho em caráter absolutamente pro bono e fiquei muito feliz quando soube que a proposta do programa foi aprovada pelo governo do país. No ano seguinte, recebi um convite da Universidade Nur para compor o quadro de professores responsável pela primeira turma desse programa. Continuo apoiando essa iniciativa, até os dias de hoje, de forma voluntária e não remunerada, convencido da importância – conforme nos ensinam as Escrituras Bahá’ís – de, além de melhorarmos a nós mesmos, a cada dia, buscarmos nos tornar fontes de bem-estar social também para o mundo a nossa volta.

Você gostaria de elaborar sobre algum ponto não explorado que considere relevante para aqueles que estão em transição de carreira? Qual seria sua mensagem final para esta entrevista?

Como mensagem final, gostaria de propor uma analogia para o tema da gestão de carreiras. Com certa frequência, profissionais de mercado, conhecidos e amigos me perguntam quais devem ser os principais cuidados com a carreira profissional, que competências são críticas, quais conhecimentos e habilidades têm maior importância, ou, ainda, que passos devem ser dados para se chegar ao topo das organizações. Às vezes, como engenheiro que sou, recorro à geometria para dar a resposta. Argumento que o caminho para o sucesso empresarial, no novo contexto, pressupõe, agora, além do conhecimento da profissão e de negócios (hard skills), o desenvolvimento de uma medida maior de excelência pessoal (soft skills), como raciocínio estratégico, liderança, inovação, resiliência, disciplina, entusiasmo, empatia, transparência, adaptabilidade, sociabilidade e espírito de aprendizagem – dentre outros. Nessa perspectiva, ao desenharmos uma carreira de sucesso, ao invés de a pensarmos na forma de uma haste – onde o crescimento se dá de forma vertical e monodimensional – melhor seria, a meu ver, pensarmos na forma de uma esfera – onde o crescimento possa se dar em várias direções e de forma multidimensional. Para capturarmos as melhores oportunidades e realizarmos todo o nosso potencial, acredito que precisamos desenvolver nada menos do que todas as nossas capacidades (hard e soft skills) e nunca esquecer de colocá-las a serviço de toda a sociedade.

Lições de carreira

Nesta entrevista, Henri Vahdat nos mostra as complexidades da governança, liderança e estratégia na carreira de um executivo excepcional. Suas palavras nos lembram que o sucesso não é apenas sobre alcançar metas, mas também sobre abraçar mudanças, aprendizado contínuo e compromisso com a excelência. À medida que nos despedimos, incentivamos você a aplicar essas lições em sua própria jornada, transformando desafios em oportunidades e alcançando realizações notáveis.

Grato pela leitura. Nos encontramos no próximo!

Abraço, Jonny

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