Duas questões recentes e que impactam diretamente negócios dos mais variados segmentos estão dando trabalho para muitas empresas: conciliar o uso de inteligência artificial e a proteção de informações exigida pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Considerando que o uso da IA depende diretamente dos dados disponíveis, temos aí um dilema interessante.
Desde setembro de 2020, quando a LGPD entrou em vigor no Brasil para garantir o direito à privacidade e à proteção de dados pessoais dos cidadãos, é possível que qualquer pessoa questione o uso de suas informações pessoais se considerá-lo indevido. A lei obriga que as empresas informem quais informações são coletadas e como elas serão usadas, e se aplica a todas as operações de dados realizadas por pessoa física ou jurídica, pública ou privada.
Quando usamos a internet percebemos constantemente os avisos e pedidos de autorização de uso e compartilhamento das nossas informações, mas somente isso não exime as empresas de penalidades. Se eu, por exemplo, autorizo minhas informações para que um aplicativo de música rastreie meu gosto musical para oferecer o que mais me agrada, não significa que essas informações possam ser usadas por outra plataforma. Ou muito menos que minhas informações ultrapassem o uso para oferta de produtos e serviços e sejam utilizadas para envio de campanhas políticas. A LGPD garante que a qualquer tempo possamos questionar e inclusive impedir o uso de nossos dados.
Esse cenário exige muito mais critério no uso de inteligência artificial e machine learning e, consequentemente, muito mais cuidado na mineração dos dados. Além de armazenar, tratar e interpretar as informações, é preciso garantir acesso a todas elas, para que, caso venham a ser questionadas legalmente, possam ser identificadas, alteradas e/ou apagadas.
Se de um lado, quanto mais dados se tem disponíveis, melhor é o desempenho da IA, de outro, maior é o desafio de depurá-los. Os dados são o alimento de todas as soluções que envolvem inteligência artificial e machine learning, seja definição de estratégias de marketing ou de perfis de consumo; na captação e fidelização de clientes, na predição de tendências, nos serviços de bots e assistentes virtuais. A assertividade dos algoritmos na detecção de padrões tem relação direta com a quantidade de dados armazenados para geração de padrões históricos que ajudarão as máquinas no aprendizado para tomar as melhores decisões.
A boa notícia é que justamente a inteligência artificial pode garantir maior rigor no cumprimento da LGPD, já que as tecnologias de compliance em proteção de dados também dependem de IA para serem postas em prática. Os sistemas podem delimitar que os dados coletados sejam aqueles autorizados para uso específico e que sejam utilizados por um tempo pré-determinado, missão que depende do aprendizado das máquinas, considerando o volume de dados em questão.
Ética, segurança e, especialmente, transparência ganham peso ainda maior no perfil das equipes de tecnologia da informação para que não se perca o bem mais precioso na relação com o cliente: a confiança. Volume e análise precisarão caminhar cada vez mais juntos para que a legislação seja cumprida e o relacionamento com o consumidor – seja de produtos, serviços ou informações seja cada vez mais saudável. É mais uma evolução que dá trabalho, mas pela qual só temos a ganhar.
Obrigado pela leitura e até a próxima!
Aqui tem um vídeo para quem está tendo o primeiro contato com o assunto:
E aqui uma reflexão interessante da Maria Queiroz no TEDx de Floripa no ano passado sobre democracia e uso de dados: