A sociedade comunica o tempo todo. Não só entre seus agentes, chamados de seres humanos, mas também comunica, como grupo, suas próprias mudanças. De tempos em tempos, a sociedade dá guinadas para um lado ou para o outro, comunicando a todos os seus agentes um novo modus vivendi, um novo tempo… Se isso é bom ou ruim, só se descobre depois deste grupo social passar pela experiência. E uma nova guinada para outro lado nunca está descartada.
Talvez o contraponto mais visível das dicotomias da sociedade possa ser visto, agora, na relação entre pais e filhos. De uma forma geral, há 40, 50 anos, a maioria dos pais impunha sua vontade sobre os filhos de tal forma que muitos dos adolescentes e jovens chegavam a ser subjugados pela hierarquia familiar patriarcal. Os filhos, não raro, eram “empregados” dos pais nos momentos de lazer e proibidos de fazer qualquer coisa que os pais não concordassem, por não compreenderem ou não considerarem adequado diante de sua visão de mundo.
Passados esses 40, 50, 60 anos, vemos a situação se inverter. Os filhos têm tudo o que precisam, muitas vezes sem demonstrar qualquer esforço. Têm muitos direitos e pouquíssimos deveres. Em geral, fazem aquilo que têm vontade e aproveitam ao máximo dos benefícios que os pais podem proporcionar. Nem sempre contribuem para a própria sobrevivência mesmo em idade adulta e cada vez mais dependem financeiramente dos pais. Praticamente inverteram a hierarquia familiar. Agora, são eles que mandam – embora com o consentimento (muitas vezes tácito e omisso) dos progenitores.
Este contraponto está visível em atitudes simples como, por exemplo, a idade em que os jovens deixam o lar paterno. Há algumas décadas, os meninos e meninas deixavam a casa da família mais cedo. Por motivos aparentamente diferentes, buscavam fugir do subjugo paterno. Ambos queriam liberdade. Buscar uma vida própria, além de uma novidade que beirava a aventura, era também uma maneira de sair de casa e criar as próprias regras. Era até motivo de orgulho. Atualmente, os jovens ficam em casa até mais tarde. Não há o subjugo; não há porque ter pressa.
O mundo (a sociedade) mudou. A vida familiar se tornou mais carinhosa e compreensiva, os filhos não se sentem mais sufocados. Conquistaram a liberdade dentro do lar paterno, não há por que fugir. Em contrapartida, esta nova geração de jovens parece mostra-se despretensiosa, malemolente, com dificuldades de se enquadrar na dura vida cotidiana pós formação escolar. É uma vida de concorrência, de disputa, onde comunicação pessoal, determinação e auto-estima fazem toda a diferença. Onde muito mais do que uma palestra motivacional, a ação do dia a dia separa homens de meninos. Onde saber não é suficiente. É necessário saber fazer.
O que teria tudo para ser um tempo de comemorações, onde os jovens podem ser mais felizes dentro da casa dos pais, coloca uma incômoda questão: teremos exagerado na dose do contraponto e ido de uma estrutura familiar opressora a uma estrutura libertária com prejuízos ao futuro de nossas crianças? Que homens e mulheres estamos preparando para a vida? Saberão eles contrapor as facilidades do caminho da casa em família para enfrentar e domar as dificuldades da vida real que os espera lá fora?
Não é surpresa nem exagero dizer, no experiente caminho da vida social, que as dificuldades encontradas na adolescência e juventude costumam forjar um adulto mais forte. Assim como ferro forjado é mais resistente e maleável do que o ferro fundido, o ser humano que é colocado à prova durante o caminho se torna mais forte e experiente para os desafios futuros. Com esses desafios minimizados ao máximo em forma de amor familiar, é de se perguntar se este exagero para o bem não pode vir a causar o mal exatamente daqueles a quem se quer proteger.
A sociedade comunica, em ações, estar vivendo um novo tempo. Resta saber quais serão os resultados futuros para esta e as novas gerações.