Tudo o que o bom e velho Aristóteles dizia soa grego aos meus ouvidos, o que antecipa as desculpas por eventual erro
na interpretação. Mas, ao que consta, o sábio via a “tirania” como uma forma de corrupção do poder legítimo.
Inspirado pelo filósofo, que formou o trio de ouro da seleção grega ao lado de Platão e do Dr Sócrates, mais tarde um dos líderes da democracia Corinthiana, declaro sem medo da análise pela posteridade: a bajulação é a corrupção da gentileza.
Fato: cada um faz o que julga necessário para pagar seus boletos. Deus fez a coluna cervical e o pescoço tão maleáveis, afinal de contas, justamente para que possamos concordar de forma bastante eloquente ou baixar a cabeça quando recebemos ordens ou reprimendas daqueles que financiam o Cuba Libre do fim de semana.
Mas até Deus, com declarada preferência por aqueles que manifestam e louvam sua grandeza, há de ter sentido uma ponta de arrependimento por carregar o dom da onisciência quando foi obrigado a ver a cena.
De paletó e uma cópia mais ou menos bem feita de sapatos italianos, o sujeito risonho abancado na primeira fila do evento fotografa loucamente os vencedores de um prêmio qualquer. Levanta, senta, ajoelha, planta bananeira, chama atenção dos homenageados para que olhem para a câmera do seu celular. O público no entorno fica até emocionado de ver toda aquela dedicação. Parece inacreditável tamanha coincidência, mas tudo indica que ele seja filho, marido, neto, melhor amigo ou coisa que o valha dos diferentes homenageados.
Nada disso!
No coquetel pós-evento, o nosso fotógrafo amador procura os alvos de suas lentes. Elogia (benzadeus, como elogia!), mostra as fotos (lindas!, lindas! Lindas!) e anota o Whatsapp das vítimas para o envio posterior das imagens (lindas demais!). Tudo para, como diz, criar conexões que mais tarde podem virar negócios. É isso: o sujeito transformou a gentileza em uma armadilha para ampliar aquilo que os moderninhos de pulôver nos ombros chamariam de “ativo intangível”.
Impossível, diante do quadro pavoroso, não lembrar a história do Profeta Gentileza, conhecido no Rio de Janeiro por pinturas urbanas e por ter popularizado a expressão “Gentileza gera Gentileza”. Uma figura e tanto, que morreu com inescapável fama de lunático, como era de se esperar.
Gentileza, parece ensinar a vida, só vale a pena para quem consegue transformá-la em faturamento.
Imagem em destaque, FreePik