Corria os anos 50/60 do século passado; a cidade: Curitiba. O bairro era chamado de Colônia Argelina (motivo óbvio) mas, depois passou a chamar-se Vila América em função dos países que emprestavam seus nomes às ruas.
A adolescência da época era, absolutamente, livre de amarras. Depois das aulas e de fazer os deveres de casa a liberdade de ir e vir era praticada por todos os jovens. O campinho de futebol na esquina das ruas México e Canadá era o principal centro de encontro. Ali a garotada se reunia para jogar futebol e planejar as outras ações que preencheriam o dia até o sol se pôr; algumas ações corriqueiras outras desafiadoras.
Ali se encontravam os bens resolvidos economicamente (ricos não existiam) e os que viviam, com dignidade, com poucos recursos, os brancos, amarelos e negros, os que estudavam em escolas privadas e os das escolas públicas, os gordos e os magros; não havia discriminação com qualquer que fossem as diferenças e, quando surgiam, eram resolvidas no diálogo e, vez por outra, havia brigas entre os diferentes, que logo após, estavam unidos pelos mesmos objetivos e sem resquícios de rancor. Os banhos nos rios da região, o apoderar-se de frutas em chácaras da região, as traquinagens feitas, independente das sentinelas, nos fundos do Quartel do 20º RI (o stand de tiro, feito em uma baixada, acumulava água que se transformava em local propício para os banhos nos dias mais quentes). Assim cresciam os jovens aprendendo a respeitar as diferenças individuais e vivendo a vida na plenitude. Respirava-se vida!
Claro que as gozações existiam e piadas eram feitas, principalmente, com os “polacos” do grupo e, consideravam-se “polacos” todos os “branquelos” da turma. As risadas eram a consequência e o troco era sistemático; ninguém se livrava da lei do retorno! O humor negro também acontecia com as piadas consideradas de mau gosto. Agora, importante salientar aos moralistas de plantão, “que atire a primeira pedra quem nunca contou uma piada que hoje é considerada agressiva do ponto de vista social ou teve algum tipo de preconceito exteriorizado ou não?” Para isto basta assistir aos programas Escolinha do Professor Raimundo; Chico Anísio e Costinha, hoje, seriam cancelados!
Aí surge nos Estados Unidos o malfadado “politicamente correto” com o intuito básico de refazer o mundo e mudar a história. Estátuas foram jogadas ao chão e em rios, escritores foram “cancelados” por uma minoria raivosa que os culpam por registrarem, apenas e, somente, o que foi a vivência de um período da humanidade. O escritor infantil, Road Dahl, nas novas edições de suas obras na Inglaterra, teve a supressão de palavras como gordo, feio e feminina para, assim, se adequar ao público atual. Sim, a escravidão existiu, as guerras mundiais aconteceram, sim existe preconceito por este mundo afora e a fome é, talvez, o maior preconceito mas, negar e abstrair da história sua existência parece-me uma rematada estupidez.
Este conceito espalhou-se rapidamente e as minorias, que sempre existiram, resolveram transformar o mundo a partir da sua visão esquecendo que há vozes discordantes e que merecem ser ouvidas e que formam a maioria; afinal é do contraditório que surgem as soluções criativas que permitiram a humanidade, bem ou mal, chegar até aqui. Quando vejo o questionamento feito a Monteiro Lobato por pessoas que nunca leram um livro sequer, penso que Stanislaw Ponte Preta estava corretíssimo quando criou o Festival de Besteiras que Assola o País; permito-me acrescentar: o mundo! Quanta estupidez.
Recentemente, pesquisa divulgada pelo IBGE, aponta que dos pesquisados 95% identificam-se como heterossexuais. Nem por isto há de se execrar os que se identificam de forma diferente, porém a minoria não pode querer impor o seu “modus vivendi” à imensa maioria. Hora de deixar o bom senso prevalecer e seria bom começar respeitando as individualidades que caracterizam a cada um de nós.
Foto:Freepik