Mr. Kotler já está com 80 anos e continua cheio de ideias revolucionárias. O sujeito praticamente inventou todos os conceitos que a gente conhece sobre marketing e estruturou a maior parte da informação disponível sobre o assunto; só essa contribuição inestimável já daria para deitar na rede e gastar o resto do tempo tomando picolé de caju na beira da praia.
Mas esse senhor não está aqui para brincadeira: no ano passado, ele lançou junto com os consultores indonésios Hermawan Kartajaya e Iwan Setiawan o esclarecedor Marketing 3.0: as forças que estão definindo o novo marketing centrado no ser humano.
Essa equipe, que de fraca não tem nada, começa justificando o tal 3.0 lembrando-nos de que o marketing teve dois grandes momentos antes do atual; na fase 1.0, o objetivo era vender os produtos fabricados a todos que quisessem comprá-los. A ideia era apresentar o que estava sendo produzido da maneira mais atraente possível, sempre enfatizando (e, na maior parte das vezes, exagerando) as inúmeras qualidades do produto. Naquela época dá para dizer que o marketing andava numas de endeusar tanto a publicidade e propaganda que os dois até se confundiram por bastante tempo (equívoco difícil de se desfazer até hoje). Em resumo, o marketing era centrado no produto; a satisfação do cliente era puramente funcional, física.
O marketing 1.0 viveu muito bem, obrigada, enquanto o mundo ainda estava deslumbrado com os avanços tecnológicos e o conforto proporcionado pela revolução industrial. Mas com o advento da era da informação e, principalmente o aumento exponencial da oferta de produtos similares entre si, o povo teve que se mexer e criar o marketing 2.0. Nessa fase, o consumidor estava mais bem informado e precisava ser seduzido com alguma sofisticação; o cliente era quem definia o valor do produto e por isso ele se tornou o centro de tudo.
No marketing 2.0, o mercado dá um passo à frente e cria conceitos. Os produtos não são apenas objetos, mas representam ideias e estilos de vida. A empresa precisa estabelecer relacionamentos e satisfazer o cliente emocionalmente. A questão é que, mesmo tratado como rei, o consumidor ainda é representado aqui de maneira passiva, como uma donzela que precisa ser conquistada.
O consumidor do século XXI, porém, quer muito mais que isso; ele quer participar, criar, dar opiniões. As pessoas começam a exigir mais; estão preocupadas com o planeta e com os rumos que as coisas estão tomando. Usam as redes sociais para criticar, mas para contribuir e desenvolver novos produtos também; as organizações precisam ficar atentas ao poder da sociedade civil conectada virtualmente.
Os consumidores mais esclarecidos querem se identificar com os valores da empresa, querem saber seu posicionamento em questões como sustentabilidade, justiça social. Os clientes não podem mais ser vistos como um cartão de crédito dotado de um corpo; são pessoas completas, com coração, mente e espírito. Kotler e seus amigos chamaram essa nova abordagem de marketing 3.0.
Agora, a organização tem que contribuir para a satisfação espiritual das pessoas. Nunca foi tão importante ter uma missão, uma visão e um conjunto de valores que realmente façam sentido e reflitam a empresa de verdade, em vez do amontoado de gerúndios que costumam frequentar as paredes em quadrinhos de gosto duvidoso.
Kotler sabe que ainda tem muita empresa praticando marketing 1.0 e 2.0. Muito poucas já se deram conta de que as coisas estão mudando rapidamente e ninguém tem mais paciência com empresa que finge que não é com ela.
A Arezzo que o diga.
Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br