À medida que a complexidade das operações urbanas aumenta, é crucial que a administração pública, provedores de serviços, organizações governamentais e não governamentais trabalhem juntos, e de forma integrada, em direção a um objetivo comum que é o bem-estar dos cidadãos. Nesse sentido, a consciência compartilhada e a coordenação contribuem para uma maior eficiência, compreensão e visibilidade das operações em tempo real. Esses elementos capacitam as cidades a enfrentarem as adversidades e, até mesmo, mitigá-las antes que um incidente ocorra. Como resultado, os órgãos de segurança pública podem se adaptar e reagir prontamente a situações em constante mudança, garantindo uma resposta ágil e eficaz às emergências.
A colaboração entre diferentes órgãos de segurança pública depende de um fator-chave: a tecnologia. Cidades inteligentes são aquelas que adotam soluções inovadoras para serem mais integradas, responsivas e adaptáveis.
Coleta e processamento de dados
Os dados são o “sangue vital” das cidades inteligentes. Independentemente da situação ou jurisdição, as autoridades precisam de informações corretas e atualizadas para tomarem decisões e agirem de forma eficaz e eficiente. Por exemplo, os serviços de transporte público podem ser modificados e aprimorados não apenas com base em dados sobre a sua utilização, mas também em informações sobre as ações dos passageiros antes e depois de usarem o serviço. Projetos de mobilidade podem ser criados com base em dados sobre hábitos da população em relação à prática de caminhadas, ciclismo e transporte compartilhado.
Esses dados podem ser fornecidos por diversas fontes, como pelos sensores de infraestrutura, câmeras de vigilância, sinais de GPS ou até mesmo publicações nas redes sociais. Trata-se de uma enorme quantidade de dados que pode ser coletada, gerenciada, analisada e interpretada para fornecer inteligência acionável e respostas às necessidades das cidades.
Orquestrar tantas fontes de dados pode parecer uma tarefa imensamente grande. Entretanto, existem maneiras de simplificá-la. A Inteligência Artificial (IA) pode auxiliar o julgamento humano ao interpretar grandes conjuntos de dados de forma contínua, autônoma e sistemática. Por exemplo, a IA pode identificar anomalias ou similaridades entre dados e, assim, alertar sobre uma situação que pode vir a acontecer, ou sobre correlações que dificilmente o olhar humano seria capaz de identificar, contribuindo para tomadas de decisão bem-informadas.
Inteligência Artificial assistiva
Os avanços na IA têm aumentado significativamente a segurança das nossas comunidades nos últimos anos, e tem ajudado governos em diversos aspectos. Na prevenção e mitigação de riscos decorrentes de inundações, incêndios florestais e desastres naturais. Também melhora a análise de imagens e vídeos, economizando um tempo valioso e reduzindo erros em investigações policiais, além de auxiliar o trabalho forense ao analisar quantidades imensas de dados e estabelecer conexões que auxiliam enormemente o trabalho dos peritos.
No entanto, as organizações ainda podem enfrentar grandes desafios para extrair inteligência dos dados antes que eles se tornem obsoletos. No mundo digital em que vivemos, os dados podem se tornar irrelevantes em um piscar de olhos. Progressivamente, esse problema está sendo tratado por soluções que recebem e aproveitam vastas quantidades de dados nos bastidores. A IA assistiva pode minerar os dados operacionais de uma organização para detectar padrões e anomalias que requerem ação imediata. Ela pode ajudar órgãos públicos a aproveitarem ao máximo os dados em tempo real antes que eles percam a sua utilidade.
Na área de segurança pública, a IA assistiva pode ajudar as forças policiais, os Corpos de Bombeiros e SAMUs a detectarem e responderem a emergências complexas mais rapidamente. A IA pode identificar padrões e conexões que podem ser cruciais para a resolução de um incidente ou para evitar possíveis desdobramentos. Por ser uma tecnologia assistiva, ela pode trabalhar nos bastidores para filtrar dados e alertar sobre não conformidades, permitindo que operadores e usuários possam sempre tomar a decisão final. No contexto dos órgãos de segurança, os quais precisam atender e gerenciar milhares de chamadas todos os dias, essa avaliação inicial autônoma é muito mais eficiente, eficaz e escalável do que o monitoramento manual e isolado das chamadas, feeds de vídeo e alarmes, além de proporcionar mais inteligência e resiliência para a gestão de incidentes que podem evoluir rapidamente.
Cidades inteligentes e a computação na nuvem
Outro grande avanço no desenvolvimento das cidades inteligentes tem sido a aceleração, adoção e aceitação de serviços hospedados em nuvem, facilitando o armazenamento, o processamento e o fluxo de dados entre diferentes organizações e departamentos. Os serviços hospedados em nuvem possibilitam a redução ou até mesmo a eliminação de barreiras em termos de conectividade, permitindo que as pessoas possam acessá-los de qualquer lugar por meio dos seus dispositivos móveis.
Outro benefício importante da nuvem é que ela aproxima os escritórios e as ruas da cidade, assim como as funções operacionais, à medida que diferentes organizações e setores reagem a questões de governança e administração. Exemplos disso são a ampla implantação de sistemas de vigilância baseados em sensores IoT, aplicativos para serviços aos cidadãos e sistemas essenciais na nuvem.
Compartilhar e agir mais facilmente de forma colaborativa com base em dados é uma das capacidades mais poderosas que a computação em nuvem proporciona. Tecnicamente, sistemas legados podem ser substituídos por novas versões em nuvem ou até mesmo podem ser complementados com outros recursos ou funcionalidades mais ágeis, como por exemplo por sistemas de colaboração em nuvem que podem extrair dados de diferentes fontes como câmeras de tráfego ou centrais de atendimento público, e coordenar tarefas de trabalho. Isso permite que as organizações usem seus próprios serviços especializados, enquanto também se beneficiam do compartilhamento de dados para se comunicarem com outras organizações e departamentos.
Considerações sobre privacidade dos dados
Naturalmente, quando se trata do tema de cidades inteligentes, a questão das preocupações com a privacidade dos dados é frequentemente levantada. Certamente, há um debate válido sobre a quantidade de dados sendo coletados e como eles estão sendo usados, e é responsabilidade das autoridades abordarem essas preocupações.
No centro de qualquer projeto de cidade inteligente, deve haver uma política abrangente e facilmente compreensível sobre como os dados são armazenados e compartilhados. Ao considerar os avanços na tecnologia de gerenciamento de dados que podem aprimorar as cidades inteligentes, é primordial que os governos considerem o propósito de coletar, usar e compartilhar cada conjunto de dados. As políticas devem incluir parâmetros rigidamente definidos, processos liderados por seres humanos e responsabilização aos seus formuladores.
As organizações devem ser cuidadosas com os dados que compartilham, especialmente à medida que as operações da cidade se tornam mais colaborativas. O compartilhamento de dados deve ser um processo transparente, com registros do que é compartilhado e com quem. Também é essencial que esses processos sejam comunicados aos cidadãos, os quais devem ter a oportunidade de expressar seus comentários ou preocupações sobre o uso dos seus dados. Após ouvirem opiniões e corrigirem o que for necessário, o processo pode ser iniciado.
Transformação das cidades inteligentes
As cidades inteligentes trazem uma série de benefícios para a vida dos cidadãos. Elas prometem respostas mais rápidas e colaborativas às emergências, transporte público mais seguro e eficiente, e muitos outros benefícios para serviços conectados ao cotidiano da população.
Muitas cidades estão apenas começando a explorar os benefícios que a tecnologia pode proporcionar. Nos próximos anos é provável que vejamos ainda mais inovação, e serão tecnologias como o gerenciamento e análises de informações e incidentes impulsionados por IA das quais dependeremos cada vez mais para ajudar a economizar tempo, dinheiro e, o mais importante, salvar vidas.
Por Sérgio Nunes, vice-presidente sênior para a América Latina da divisão de Segurança, Infraestrutura e Geoespacial da Hexagon, empresa sueca com atuação global.
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