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Coluna Lígia Fascioni | Como calcular ofensas
02 de Janeiro de 2017

Coluna Lígia Fascioni | Como calcular ofensas

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Já faz um tempo que havia sumido, mas semana passada voltou a circular nas redes sociais um meme com os dizeres “a minha educação depende da sua” e suas variações “minha atitude depende de quem tu és”, “sou legal com quem é legal comigo”. A frequência e a convicção com que se compartilha esse tipo de mensagem são preocupantes, para não dizer assustadoras.

Nem vou entrar na vida pessoal; vamos analisar apenas a questão profissional: como vou contratar ou trabalhar com alguém que se orgulha de deixar a decisão de como vai se comportar nas mãos de um estranho? Nunca vou poder confiar nessa pessoa; vai que um grosso aleatório entra em contato com ela? Um profissional excelente tem um código que conduta que independe da educação, caráter ou postura de quem está do outro lado.

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Ah, mas fulano me ofendeu. Eu não podia deixar barato.” Ah, é?

Penso que a chave de tudo está na palavra ofender. Pense: é impossível ofender uma pessoa que não se deixa ser ofendida. E a ciência da computação (ou sei lá como se chama isso agora) pode nos ajudar a entender essa questão de um jeito bem simples, veja.

Numa rede de comunicação, as mensagens vão e vêm misturadas no mesmo meio; são vários emissores e vários destinatários compartilhando o mesmo caminho, o que pode gerar erros. Por isso, inventaram um negócio muito útil que se chama protocolo. Ele é que determina como vai ser o formato da mensagem ou do dado. A parte mais legal, que a gente deveria levar para a vida é uma coisa chamada checksum, ou dígito verificador. Para que serve isso e o que tem a ver com ofensas?

Sabe o número do seu CPF ou sua agência bancária? Não tem dois dígitos (ou um, ou três, isso pode variar dependendo do protocolo) no final? Pois é: existe uma equação matemática particular que pega a sequência de números, faz as operações e dá como resultado aqueles dois dígitos que aparecem no final, o tal checksum. Cada protocolo tem uma equação diferente que usa todos os números. Ele faz a conta e verifica se o resultado são aqueles algarismos finais que você colocou. Se não for, é porque tem alguma coisa errada.

O que acontece se o verificador não estiver correto? Simples, o programa ignora e não aceita a mensagem. O número está errado, foi corrompido em algum ponto ou é simplesmente inventado.

Voltando à questão da ofensa, cada um define como é seu protocolo, ou seja, seus princípios. Quando recebe uma mensagem, você calcula seu próprio checksum e verifica se aquilo é verdade, se contém erro ou se foi inventado.

Então: se alguém lhe envia uma mensagem que não confere com os seus princípios, ou seja, o checksum não bate, é só ignorá-la. Não é para você. A informação foi corrompida no caminho ou o emissário inventou aquilo. Não tem porque você aceitá-la e recebê-la. O procedimento correto válido para qualquer protocolo é ignorar.

Se o checksum estiver correto, então também não tem porque se ofender, afinal, a informação está certa. Receba e processe sem dramas, sem se achar ofendido.

Isso me lembra um caso que ocorreu uma vez em Blumenau, no Biergarten, durante uma Oktoberfest. Um sujeito visivelmente bêbado cismou de xingar um moço sentado numa mesa. Desatou a recitar impropérios de todos os tipos, xingou a mãe e a família inteira do moço, e ele lá, firme, continuando a conversa com seu grupo. O bêbado foi ficando cada vez mais nervoso, o que fez a cena ficar cômica: ele sapateava e não se conformava com o desprezo do outro. Até que ficou rouco, se cansou e foi embora. O que fez ouvidos moucos foi aplaudido no final, claro.

Então, a sua educação, o seu comportamento, a sua credibilidade, o seu nível de maturidade, o seu profissionalismo, a sua gentileza, a sua civilidade, o seu caráter e quem você é, independem completamente de quem está interagindo com você.

Afinal, você, e somente você, é o dono do seu protocolo e pode decidir se a mensagem é válida ou não.

Bora fazer as contas.

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