Março de 1959. Com a saída da conta da Caterpillar da Grant Advertising, fui alocado na conta da GE, cujo Gerente de Marketing era Heitor Wethger (peço desculpas se o nome não estiver certo). A campanha era do lançamento de novos modelos de televisores, mais finos, que batizamos de “Linha i”. Mas as perspectivas na agência eram obscuras.
Mais uma vez, surge Plínio Toni, que estava na Lintas. Para esclarecer, a Lintas Worldwide era uma agência de publicidade que pertencia ao Grupo Unilever, a quem atendia em todo mundo com exclusividade. A Lever, por sua vez, dividia a conta com a J. Walter Thompson. Voltando ao Plínio:
”Julio, seu Lima (Lima Martensen, diretor da agência, com quem tivera uma entrevista um ano antes) me disse que a Lever vai contratar uma pessoa para o Marketing, que é para você se apresentar lá, e que ele já deu seu nome para o Diretor de Marketing, John Somerville”.
Naquele sábado ia acontecer um futebol no Clube Inglês entre Lintas e Lever, e Plínio me chamou para ajudar no time da Lintas, que tinha menos jogadores. Lá fui eu de “laço”. Havia chovido muito e o campinho estava uma lama só. No meio do jogo, numa disputa de bola pelo alto, o atacante levou a pior e se esparramou no barro, enquanto eu, zagueiro competente, saia com a bola. Sem falta. Depois, durante a confraternização, fui me desculpar e percebi que o cara era estrangeiro, falando mal e pouco nossa língua.
Semana seguinte lá estava eu, no prédio onde se instalavam Lever e Lintas. Como combinado, passei antes na sala de seu Lima:
“Lembra que há um ano eu disse que ainda iríamos trabalhar juntos? Chegou o momento. Não é na Lintas, mas no cliente, na Lever. É uma excepcional oportunidade, pois a empresa está trazendo para o Brasil toda a experiência de marketing que acumula na Europa e USA. Nilza, a secretária, já está te esperando, no quarto andar – vai lá e depois volta aqui pra me contar”.
Desci um andar e a Nilza me encaminhou para a sala do Sr. Somerville. Adivinhou né? Era o inglês que eu jogara na lama! E agora?
Ele mesmo se encarregou de afastar qualquer constrangimento com uma sonora gargalhada, que eu ouviria muitas outras vezes, se contrapondo a explosões de raiva. Ficamos falando por longo tempo, intercalando seu português remendado e meu inglês de principiante, ao fim do que Somerville me encaminhou para Rodwell, o diretor de RH, que simplesmente listou os documentos necessários para minha admissão.
Admitido assim? Eu estava vivendo um sonho. Bastava isso? Uma conversa com o inglês que eu havia derrubado e enchido de barro? Nunca falamos sobre isso depois, mas tenho certeza de que a recomendação do Lima foi decisiva. Voltei à sua sala e ele me deu um efusivo abraço – estávamos trabalhando juntos, ele já completamente realizado e eu iniciante.
Fui admitido como Assistente de Gerente de Produto, o que significava efetivamente uma excepcional oportunidade – a Unilever havia mandado para sua operação no Brasil, a qual antevia como extremamente promissora, uma equipe de executivos com grande experiência em marketing, que ainda engatinhava entre nós. O mesmo havia feito Colgate, por exemplo, entre algumas outras poucas empresas multinacionais. Gessy, a grande concorrente da Lever, havia importado ex-executivos da Procter & Gamble, o que fazia antever uma aquisição.
O fato é que eu era Assistente de Gerente de Produto em Irmãos Lever e ia trabalhar com Rafael Martin Rios, Gerente de um de dois grupos de produtos, do qual o mais importante, aliás, o mais importante de toda empresa era Rinso, o sabão em pó que se propunha a revolucionar a atividade de lavar roupa e, consequentemente, a vida das donas de casa brasileiras.
Começarei a descrever como isso foi feito e muito mais. A partir deste ponto, vou abandonar o rigor cronológico, porque acho que o mais importante é falar das pessoas com quem convivi por dez anos e os acontecimentos a elas ligados.
Espero você na próxima coluna
