Publicidade
Coluna Julio Pimentel | 60 anos na estrada: Mentasol
19 de Abril de 2017

Coluna Julio Pimentel | 60 anos na estrada: Mentasol

Twitter Whatsapp Facebook

Na última coluna, a 11ª sobre meus 60 anos de estrada, falei que logo nas minhas primeiras ações na Lever conseguimos prolongar a vida do dentifrício Lever SR, melhorando sua margem financeira com redução do custo de embalagem, tubo e cartucho. Isso de fato aconteceu. Falei também que uma das medidas tinha sido a adoção da mesma tampa do tubo de Signal. Não foi isso provavelmente, pois Signal foi lançado bem depois, embora não seja impossível, já que o desenvolvimento de um produto novo é longo e exige testes do produto e suas embalagens. Ou talvez tenhamos mudado a tampa de Mentasol, outro dentifrício da Lever no mercado e que havia sido a mim entregue para cuidar, enquanto SR era do outro grupo. De qualquer forma, a economia foi implantada e SR permaneceu por mais alguns anos para escovação de muitos dentes brasileiros. 

Não me lembro dos detalhes com exatidão, mas essas considerações remetem à campanha de Mentasol, cujo tema internacional era “Brush ‘morning mouth’ away”, literalmente “Escove (livre-se de…) a ‘boca da manhã’. O texto dizia que é muito comum ter mau hálito ao acordar, explicava por que e remetia ao novo dentifrício com clorofila. No Brasil, a estratégia foi atacar o tema mau hálito de maneira direta, não tão sutil, e não só ao acordar. Anúncios mostravam ilustrações de um diálogo antes e depois de usar Mentasol – antes com cheiro de cebola e depois, com perfume de rosa. Reproduzo aqui exemplos das duas campanhas e me pergunto se hoje, sob o jugo do politicamente correto, o Conar ia considerar a promessa de Mentasol verdadeira…

Publicidade

Com relação a Signal, conta a história que na Inglaterra, aí pela década de 40, um criativo da JW Thompson, agência que tinha a conta de um dentifrício da Lever, teve uma ideia – hoje seria qualificada como Inovação – e levou-a para o gerente de produtos: por que não criar uma câmera rígida interna na ponta do tubo, com creme de outra cor, e gerar um creme dental listrado? O Gerente de Produto, que quase sempre tem o poder de dizer não e raramente sim, desconsiderou a proposta e enterrou o assunto numa gaveta. O tal criativo, em respeito à ética, demitiu-se da JWT e trabalhou com sucesso no desenvolvimento da traquitana, que num segundo momento acabou vendendo para a própria Lever, assegurando para si um percentual na forma de royalties que, tudo indica, propiciou sua aposentadoria precoce. Em dias de Lava Jato & Delações, confesso que não tenho como provar, mas naquela época era tudo tido como verdade passada de boca em boca.

Voltemos às mudanças na embalagem de SR. A Lever tinha um Departamento de Embalagens, instalado no mesmo andar da Propaganda, o que acentuava uma proximidade natural entre as duas atividades. Nada que dissesse respeito à embalagem, de qualquer tamanho, produto ou tipo, podia ser aplicado sem antes experimentado, especificado e finalmente homologado pelo departamento. E muitas vezes criado, por iniciativa de seus integrantes ou por solicitação de outro departamento. Era o caso de SR, que seguiu o protocolo. Dirigia o setor Alex Lotschinin, figura afável e competente, que muito depois foi contratado pela Avon para dirigir o seu departamento. Na Lever o staff era pequeno, quatro ou cinco pessoas, e o segundo na hierarquia era José Sinqueviske, que também, anos depois, deixou a companhia para dirigir esse setor na Nestlé. 

Sobre Sinkevisque quero falar um pouco mais, como homenagem ao relacionamento de amizade que estabelecemos. Era um cara sólido, forte, puxava ferro (halterofilismo) todos os dias. Ria muito, era grande, de aparência truculenta, mas com coração e alma de criança. Admirava-me sua capacidade de manusear, com mãos tão fortes e grandes, elementos como papel e cartão, gerando formas cheias de pequenos detalhes. 

Anos mais tarde, já Gessy Lever, ficava do outro lado no mesmo andar, na Propaganda, um gerente de produto de quem muitos certamente se lembram e sobre o qual voltarei a falar aqui: Luiz Del Nero Neto. Del Nero era grande gozador, gostava de dar apelidos aos colegas e brindou Sinkevisque com “Zé Cabeça”, que o próprio encarava com aparente bom humor, menos quando algum estagiário – e eram muitos – atravessava o corredor e ia até ele para pedir:

“Seu Cabeça, o seu Del Nero mandou pedir uma retícula emprestada”.
“Seu Cabeça, o seu Del Nero pede para o senhor mandar duzentos gramas de off-set”.

O clima era sempre assim, descontraído, leve, mesmo quando as tarefas eram pesadas.

Quero ressaltar que menciono muitas vezes aspectos pessoais, pois acredito que, assim como as ligações entre pessoas formam uma rede indelével e há entre elas uma interdependência, os fatos e circunstâncias da mesma forma afetam a postura e o desempenho ante a vida, incluindo, claro, a atividade profissional. Além disso, entre meus leitores, que generosamente acompanham estas memórias, a maioria está no ramo da comunicação e afins, mas há os das redes sociais, que não militam por aqui, e sempre curtem um pouco de vivências pessoais.

Pois bem, Sinkevisque e eu formamos uma sólida amizade, com mais quatro companheiros saídos do ambiente de trabalho, que durante mais de uma década conviveram, se apoiaram e se divertiram com suas famílias, sobre o que voltarei a falar oportunamente.

Agora quero apenas citar o fato que era maçon e queria que eu entrasse para a Maçonaria, o que realmente me agradava. Ele se dispôs a me apresentar e eu fiquei na expectativa, até que, passado algum tempo, cobrei a promessa, e ele:

“Julião, deixei a Maçonaria. Encontrei outro caminho, incomparavelmente melhor e quero que você conheça. Vou te inscrever nos Cursilhos da Cristandade”.

E assim fez, abrindo-me todo um ciclo de vida, que ainda espero abordar por aqui.

Recordações dos verdes anos da caminhada, que vou continuar relatando na próxima coluna, onde fico esperando por você.

 

Publicidade