Já estamos carecas de saber que os atos comunicam, certo? Aliás, as atitudes comunicam melhor do que as próprias palavras, pois são a tradução prática daquilo que se pensa ou diz. Diante disto, fica claro o que a Universidade Federal de Santa Catarina comunica neste momento.
Ao, em uma mesma semana, rejeitar o programa Future-se, deflagrar uma greve e ver seu reitor tirar férias, a UFSC dá um recado claro à sociedade: não admite mudar o status quo reinante naquele reduto de ensino superior, acostumado bem mais aos embates ideológicos e facilidades financeiras do que aos novos tempos de austeridade econômica e contrapartida social.
Esquartejando o parágrafo imediatamente acima, começamos pelo Future-se, para o qual a UFSC disse não. O programa Future-se, proposto pelo Governo Federal, busca o fortalecimento da autonomia administrativa, financeira e da gestão das universidades e institutos federais. Essas ações serão desenvolvidas por meio de parcerias com organizações sociais. O programa se divide em três eixos. Gestão, Governança e Empreendedorismo, Pesquisa e Inovação e Internacionalização.
Mas onde a coisa pega? No fato que o programa propõe “amarras” para uma melhor gestão, o que não é bem visto por aqueles que gostam da farra do gasto do dinheiro público. Ele propõe promover a sustentabilidade financeira, ao estabelecer limite de gasto com pessoal nas universidades e institutos — hoje, em média, 85% do orçamento das instituições são destinados para isso.
Além disso, quer estabelecer requisitos de transparência, auditoria externa e compliance, bem como propiciar os meios para que departamentos de universidades arrecadem recursos próprios – o que alguns gestores das federais não querem, pois dá trabalho. Melhor é ficar sentado esperando dinheiro federal (dinheiro dos impostos que pagamos) para custear as despesas desenfreadas.
O contrassenso aumenta quando cerca de 30% dos universitários da UFSC deflagram uma greve contra o corte de recursos federais, aquele anunciado contingenciamento pelo Governo Federal, na mesma semana em que a universidade rejeita o Future-se (que, como coloquei acima, permite outras formas de captação de recursos). Ou seja, reclama-se da falta de dinheiro, mas não se quer contribuir para buscar os recursos necessários.
Chegamos então ao terceiro ponto daquele parágrafo: é cômodo gerenciar vultuosos recursos financeiros públicos (fala-se em R$ 1 bilhão/ano, algo comparado ao orçamento da prefeitura de Florianópolis, a capital catarinense) que chegam garantidamente, ao invés de ter que trabalhar para aumentar este montante, sendo auditado e tendo limites para a farra de salários e contratações. Um reitor de universidade ganha mais do que um governador de estado ou prefeito de capital, sem a mesma pressão que exercem Tribunal de Contas e Ministério Público sobre as contas da administração pública estadual ou municipal.
Resumindo: a UFSC comunica que está na contramão dos novos tempos, onde a sociedade exige austeridades nos gastos, transparência e respeito ao dinheiro público. Isto não tira a importância histórica da universidade na formação de gerações de profissionais para o mercado. Mas isso só não basta diante de nossa realidade. Resultados acadêmicos são bom discurso para universidades particulares, onde os alunos – e só eles – pagam pelo ensino obtido. Quando o dinheiro é de todos, é preciso muito mais do que resultados acadêmicos.
Para piorar a situação, cresce cada vez mais a crítica ao sistema de universidades públicas gratuitas onde os estudantes, ao se graduarem no curso escolhido – e, reitero, pago por todos nós, não dão qualquer contrapartida à sociedade (aquele conjunto de pessoas que pagou os seus estudos). Aliás, este é um novo desafio para o Governo Federal: estudar uma fórmula em que os universitários de universidades federais, que estudam com o dinheiro de todos os pagadores de impostos, sejam obrigados a dar uma contrapartida à sociedade. A prestação de serviços gratuitos à comunidade dentro da área de formação logo após a conclusão do curso, por um período determinado, soa como a melhor maneira de se fazer justiça social neste caso.
Verdade; vivemos novos tempos em que os discursos (especialmente ideológicos) não bastam para saciar a sede e fome de justiça social que o brasileiro tem. A sociedade comunica que é necessário que todos deem sua contrapartida para a construção de um país melhor e mais justo. O que não se esperava, é que a UFSC fosse comunicar exatamente o contrário aos catarinenses.